quarta-feira, 24 de março de 2010

NUDEZ


Retrato de Marjorie Ferry -1932
Tamara de Lempicka   

CH 37
Nas ultimas noites tenho a sensação de não estar sonhando e, quando sei que sonhei, não consigo ter lembranças claras.
Essa noite teve um pedaço que guardei em mente: eu estava numa casa que era da minha irmã (nada a ver com o apartamento no qual ela reside). Primeiro eu carregava a bolsa dela para verificar se as duas passagens aéreas estavam em sua carteira. Ela e meu cunhado iam viajar e fui atender o seu pedido de verificar se as passagens estavam guardadas. Eu passei pelo jardim que, ao invés de plantas, tinha pedras lisas e pretas bem grandes (batiam no joelho) e a bolsa dela estava muito pesada (devia pesar de seis para sete quilos). Eu não podia deixar a bolsa no jardim, pois facilmente algum ladrão poderia pegar. Não suportando o peso pedi ajuda para minha mãe e entreguei-lhe a bolsa para ela colocar dentro da casa. Nisso eu fui tomar banho e já estava despida quando vi vultos passando pelo jardim. Fiquei preocupada com a bolsa da minha irmã, mas não podia sair correndo nua. Chamei a atenção da minha mãe e depois minha irmã reconheceu que eram dois sujeitos que ela chamara para verificar algo que não escutei exatamente o que era. Todos já haviam tomado banho e eu ficara por ultimo, de modo que estava apressada em fazê-lo e, assim, despreocupei-me com o resto, ou seja, com o que estaria acontecendo fora do banheiro.
No que me despi e abri o chuveiro, a água estava praticamente fervendo de tão quente e, de repente, apareceram dois homens (um jovem e outro velho) para conservar o chuveiro. Enquanto isso meu cunhado dava auxilio de conserto olhando por cima (era como se ao invés de teto houvesse uma parte superior de madeira, algo que nem sei explicar). Constrangida me cobri com a cortina que separava o boxe, mas ela era praticamente transparente. Ao mesmo tempo eu tentava não ligar muito para o fato de verem o meu corpo desnudo (eu me sentia a vítima e isso me tranqüilizava), mas queria retirar-me do local para que eles não aproveitassem da situação a fim de ficarem me observando (eu não queria ficar apenas como vítima). Eu estava interiormente acanhada por não saber como reagir e irritada por eles terem entrado de supetão no banheiro e invadido minha privacidade. Sem alternativa eu saí de trás da cortina e, agindo com naturalidade (um tanto forçada), peguei meu roupão e vesti. Depois me vi vestida com um vestido por baixo do roupão e parecia ter dado o banho por encerrado. Creio que já ficara indisposta a ter que voltar para o chuveiro que estava tão difícil de ser consertado.
Continuação
Depois de finalmente consertarem o chuveiro, os dois homens e eu começamos a conversar. Não sei exatamente como foi esse inicio de conversa, mas sei que eu estava
olhando fixo para os olhos ora de um e depois do outro quando me detive examinando a boca do homem mais velho. Ele tinha os dentes tortos e uma barba meio grisalha com partes ainda pretas e outras já completamente brancas. Comecei a pensar que ele mais parecia um mendigo do que um encanador quando ele, julgando de maneira errada o meu olhar, se aproximou segurando no meu braço em procura de mais intimidade. Mandei ele largar o meu braço e dava tapas na mão com que ele que me segurava, mas estes batiam nele de leve como se eu não tivesse a mínima força física para o movimento. Depois de três fracos tapas eu resolvi usar a entonação de voz e sendo completamente imperativa ordenei que ele me largasse enquanto fuzilava ele com um olhar direto. Imediatamente ele me soltou e, pelas minhas costas, disse numa tentativa de me amedrontar: ‘Você vai ver’. Era como se ele quisesse dizer ‘você ainda me paga por me recusar’. Muito corajosa eu voltei a encará-lo e perguntei muito séria e num tom mais nervoso: ‘Eu vou ver o quê? Você está me ameaçando?’ Ele pareceu assustado e nada falou. Voltei a insistir: ‘Fala homem, o que é que eu vou ver? Acha que eu tenho medo de você?’ Eu não podia saber ao certo se ele estava sem graça ou irado com minha reação, mas vendo que ele não tinha o que responder, eu fui para o quarto guardar o roupão. Minha irmã me olhava de lado com cara de reprovação e eu não entendia como tivera tanta liberdade para me defender daquela maneira ali, na frente dela. Neste momento me dei conta de que não eram apenas dois homens contratados para consertar o chuveiro, pois por certo, deveriam ser também dois conhecidos ou amigos dela e do meu cunhado que, inclusive, iam ficar para o jantar. De toda forma isso não mudava minha opinião de que o sujeito mais velho fora abusado tentando me agarrar em pleno corredor. Quando voltei percebi que todos já estavam na mesa jantando e, outra vez, estava eu ficando por último (assim como acontecera com o banho). Eu não estava com fome, mas sabia que precisava comer para depois não ter dor de cabeça (isso me aconteceu durante o dia). Quando ia entrar na copa o sujeito com o qual eu discutira veio me pedir desculpas. Disse-lhe com sinceridade que tudo bem, pois por mim nada acontecera e daria o caso por encerrado. Contentei-me pela possibilidade do entendimento, entretanto, bastante amuado, ele passou para o quarto e sem acender a luz, sentou-se na cama. Eu não sabia se ele estava se fazendo de coitado, mas aquilo não me agradou e disse-lhe: ‘Você não precisa ficar aí deprimido com o que aconteceu se auto-culpando, é só entender que não gostei da sua atitude e ter capacidade de assumir quais foram suas intenções sem joguinho de vingança’. Apesar da minha fala, ele continuou cabisbaixo como se quisesse que eu me sentisse culpada pelo seu estado de tristeza. Saí de perto dele demonstrando que não ia ficar acalentando ou consolando seu mal-estar. Longe de sentir culpa, pensei que ele ainda podia resolver se vingar de verdade e somente então tive uma ponta de medo, mas interiormente eu estava tranqüila comigo mesma e essa era minha força de coragem. Exatamente nesse ponto eu acordei.
Parece um sonho tão longe da realidade, mas ao mesmo tempo provoca em mim um estado de animo feroz em busca dessa coragem de equilíbrio para agir com naturalidade e reagir com maturidade tendo pulso firme em minha própria defesa. Será que foi um bom sonho?


2 comentários:

  1. Como sonhos não tem fim, eis mais alguns: Sonhei com muitos casais de cobras finas na garagem que, esticadas, se encontravam cabeça com cabeça formando várias linhas de cobras paralelas num alinhamento diagonal. Havia alguém lavando a garagem, acho que era a faxineira do inquilino da casa de cima, e minha mãe olhava essa pessoa da porta de entrada daqui de casa. Perguntei a minha mãe se não iam matar as cobras e ela respondeu que não sem dar maiores explicações. Nisso eu quis acordar e não conseguia. Chamava pela minha mãe para ela me acordar. Minha voz saia sôfrega e rouca. Sabia que me desesperar era pior. Eu precisava me acalmar se quisesse acordar e, como em todas as vezes que sonhei com isso, tentei manipular a situação não forçando o despertar para ele vir a ocorrer de modo natural. É como se de certa forma eu estivesse com meu cérebro acordado, mas todo o resto do meu corpo não me obedecesse estando em profundo sono. Isso continuou desesperador até que de fato consegui acordar bastante assustada. Quando voltei a dormir sonhei que meu dente canino esquerdo estava mole e quebrado enquanto havia outro torto e pequeno nascido por dentro. Eu estava de luva preta rendada e conforme mexia no dente para analisá-lo, a luva sujava com bastante sangue. Por fim eu tirei a luva suja ainda perplexa e penalizada tentando entender como meu dente ficara daquela forma. Sonhar com tudo isso foi horrível e eu me sentia sem ter o que fazer para mudar ou sanar os problemas. Será que isso tem referência a esse mesmo sentimento com relação a situações concretas da vida?
    Também lembro de ter sonhado algo bom. Eu estava acordando cedo para ir à escola e me perguntava como fora optar por isso. Só fui amante de acordar cedo em situações esporádicas e sofria na época da escola para levantar cedo da cama todo dia. Uma vez já formada em nível superior não entendia como voltara a estudar na parte da manhã, ou melhor, como tivera coragem para tal. Entretanto, depois de estar no local, acho que era uma universidade, já estava bem e feliz com os estudos. Eu tinha uma apostila bem grossa e enquanto o professor anotava alguns tópicos dela no quadro para prosseguir com a aula, eu lia um livro de literatura. Dois dos meus maiores prazeres sempre foram ler e estudar algo que seja do meu interesse. Ali eu estava fazendo as duas coisas juntas. A aula era sobre os olhos e verificávamos toda a estrutura da visão. Quando chegou o intervalo eu estava na sala dos professores e conversava com o professor cuja aula acabara de ter. Não lembro bem da conversa, mas com sinceridade eu procurava dizer tudo o que ele gostaria de escutar. Disse que ele precisava fazer o que fosse melhor para sua felicidade, mesmo que isso fosse deixar saudade em vários corações. Eu sabia que ele queria mudar da cidade, mas estava tendo dificuldades de conseguir transferência ou, talvez, houvesse algum outro motivo não revelado a segurá-lo ali. Ele me perguntou se eu mudaria mesmo de cidade se estivesse no lugar dele. Percebi que ele queria saber de maneira geral e não apenas se eu estivesse no lugar dele. Respondi que sim, que mudaria e residiria em qualquer cidade que eu viesse a gostar e donde eu pudesse me sentir mais feliz. Se ele não estava feliz em tal cidade, ele tinha sim que ir para onde se sentisse melhor.

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  2. Continuação...
    Transferindo isso para minha realidade: eu gosto muito do lugar donde morro e dou para trás todas as vezes que minha mãe fala de mudar de cidade. Ela muito já cogitou em morar em Caldas Novas e só ainda não foi por causa da minha avó que também mora aqui em Uberlândia. Minha irmã fica falando da possibilidade de eu ir morar em São Paulo de futuro para ficar perto dela, mas eu detesto cidade muito grande e, além do mais, tenho minha amada chácara por aqui me esperando. No sonho eu fui clara em dizer que não tinha problema com uma mudança de cidade pois o contexto era de insinuação. Eu dizia sobre mudança deixando implícito, ao menos para mim mesma, que a faria com ou por alguém como ele. Ali eu não estava respondendo por base na minha vida real, mas com relação ao contexto onírico em si. Eu folheava um jornal tentando distrair-me e também para disfarçar meu olhar que se focava no professor remexendo em seus materiais. Ele devia ter uns trinta anos, com aparência entre jovial e madura. Tinha os cabelos curtos atrás, mas soltos em mechas na frente, dando um ar entre esportivo e despojado.
    De repente ele aproximou-se e me beijou. Embora eu estivesse com uma postura super simpática por causa de interesses ocultos, subestimei minhas capacidades de conseguir ter alguma chance de uma intimidade maior com aquele homem. Eu queria o beijo, mas pensava que não deveria aceitar aquilo, pois estaria entregando meus sentimentos. Eu queria fazer o charme dando uma de difícil, mas eu estava contente de mais para esquivar-me do beijo. Aquilo fora completamente além dos meus planos e eu fora pega de surpresa, mas estava adorando. Tentei sim me desvencilhar dele, até porque estávamos na sala dos professores e mais gente podia chegar a qualquer momento. Ali não era lugar para envolvimentos, muitíssimo menos de um professor com uma aluna. Quando ele parou de me beijar eu lhe pedi desculpas pelo acontecido, dizendo que agira imprudentemente aceitando aquele beijo ali, algo que poderia prejudicá-lo, mas expliquei que não conseguira resistir. Para contra-gosto eu acordei. Tal sonho parece apenas uma porta de auto-conhecimento para mim. Não sei porque sempre subestimei tanto minha real pessoa. Muitos já se surpreenderam comigo e, de certa forma, eu também. Sou daquelas que joga verde para colher maduro nunca achando que vai conseguir de fato colher algo maduro quando a colheita é relacionada com relações humanas. Sou a moda mineira: comendo pelas beiradas... mas em geral acho que posso fome. Não tenho facilidade para conseguir as coisas, mas as consigo sempre que meu querer é motivador. Para as coisas que o querer não impera eu me deixo levar sem muito forçar ou rejeitar, apenas crendo no dito popular: o que tiver de ser, assim será. O que você acha de tais sonhos?

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