quarta-feira, 8 de setembro de 2010

INDIVIDUALIDADE E PRIVACIDADE


Carla

Na sequência eu estava com minha irmã, que estava grávida, meu cunhado e sobrinha. Estávamos num local de muita neve e procurávamos um restaurante para comer. Nisso comentei que esquecera a máquina fotográfica e separei-me deles para ir buscá-la. Embora parecesse vantajoso estar com eles, eu preferia estar sozinha. Pensei comigo que na próxima viagem eu ia pensar melhor entre ir só ou ir com eles. Houve um momento no meio desse sonho, cujas lembranças parecem vagas, donde entrei num ônibus com um monte de mochilas. Do lado de fora havia muita neve e embora estivesse atenta a tudo, sumiram duas de minhas mochilas. Comentei com o motorista sobre o possível roubo e disse que o endereço para donde ia, meus documentos e todo o meu dinheiro estava numa das mochilas que sumira. Embora preocupada, eu não estava tensa, pois sentia que a situação não ia ficar por isso mesmo, ou seja, tinha comigo a certeza de que há males que vem para bem. Ele disse que ia desviar a rota, mas não entendi em que isso poderia ser útil. Desconfiei de três homens que estavam dentro do ônibus, pois eles me olharam com jeito desafiador. Notei que eles deveriam ser os malandros e fui falar pessoalmente com eles. Primeiro aproximei de um que parecia coreano e comentei que a vida dele poderia mudar totalmente se suas atitudes mudassem. Ele pareceu entender o recado, disse que ia pegar um voo para algum outro local e começar vida nova. Enquanto isso, um dos outros dois quis saber que intimidade verbal era aquela e comentei que quando ele estivesse a altura de entender-me, eu passaria o recado. De certa forma eu já não estava preocupada com as minhas mochilas, pois sabia que estava cumprindo meu dever e que o roubo das mesmas fora providencial para algo além da minha racionalidade. Infelizmente só lembro até aí.

O que tais sonhos querem me dizer?

O seu movimento, a sua ação, ou suas escolhas, podem indicar uma dinâmica de fortalecimento de sua individualidade, um processo de desgarramento e de libertação.

Quando o sujeito fortalece sua individualidade, aprende a conviver consigo mesmo. O que parece uma coisa natural, saber conviver com si mesmo, se mostra uma conquista de poucos. Em geral elas pensam que se amam, que se adoram, que se bastam, mas vivem apenas a idealização deste desejo. Elas não sabem estar só, consigo mesmo, envolvidas em projetos pessoais, envolvidas em suas dinâmicas de aprimoramento, estudos e desenvolvimento. Na verdade vivem uma profunda solidão inseridas em contextos sociais turbulentos e cheios de movimentos, dessa forma elas conseguem aplacar a dificuldade de terem de conviver consigo mesmo.

Este é um dos grandes males da vida moderna. O externo chama em excesso, é sedutor e envolvente e quando nos entregamos a essa babilônia pós-moderna abre-se mão da privacidade, das buscas pessoais, do prazer de viver consigo mesmo, na ilusão de preencher o buraco existencial. Só que este buraco permanece presente, como um buraco negro, que “come tudo”, que a cada dia mais matéria exige, mais esforço. E o individuo já sem a riqueza da pessoalidade, sem saber conviver consigo mesmo é enredado na trama da armadilha que construiu para si mesmo. E acaba consumido pelo coletivo.

O coletivo é essencial, mas não é tudo. É preciso trabalhar a pessoalidade, nossa singularidade para que encontremos em nos o sentido da existencial, caso contrário podemos passar pela vida como perdidos, que se “acham”, mas que não se encontram. Perdidos de si mesmo, na ilusão de um universo fantástico, mas sutilmente ardiloso, se não agirmos como guerreiros.

Naturalmente, ninguém se basta, mas cada um nessa vida tem um encontro marcado com a existência. Um encontro que não pode ser relevado. E para este encontro precisamos nos preparar. Hoje infelizmente, o simplismos leva a maioria à buscas que apenas lhes dão o conforto de estarem fazendo alguma coisa. No fundo sabem que pouco ou quase nada estão fazendo para se preparar para este encontro fatal com o destino.

Na sequência do sonho aquela velha forma de focar suas obsessões reaparece: O medo de ser lesada, roubada, enganada, o medo de perder, o medo da perda da referência do poder e da representação de sua imagem. Mas em seguida a nova mulher reaparece com novas respostas, com uma nova forma de lidar e responder aos desafios da realidade, E agora não mais como aquela que apenas sofre as consequências das mudanças inoportunas, da imprevisibilidade, mas como um sujeito que tem escolha e atua, intervém, indica o erro, o descompromisso, sem o medo do subjugado.

Essa é a conquista, sua vitória que aparece: A mudança do padrão de resposta. Não mais como a menina vítima, mas como mulher, como Sujeito, individuo que faz escolhas e interfere na construção da realidade, de sua realidade.

Você diz:

“eu já não estava preocupada com as minhas mochilas, pois sabia que estava cumprindo meu dever e que o roubo das mesmas fora providencial para algo além”.

Este é o espírito da coisa. Não se pode focalizar a força no que é pouco importante, é preciso cumprir o dever, o dever pessoal, e entender que existem forças superiores que nos propõem desafios que precisam ser superados e que geralmente à frente poderemos compreender um pouco melhor os desígnios para nossa vida.

Quando nos damos mais importância do que ao divino, damos importância às ilusões de tirania e poder que ansiamos e projetamos, assim fortalecemos a vaidade, o narcisismo, e deixamos de aperceber e apreender os sinais divinos que indicam o sentido de nossa existência. Quando caminhamos em sintonia com os desígnios da vida a providencia divina nos ampara, no guia, nos protege e nos encaminha para aquilo que é nosso dever realizar: o pleno sentido da existência.

Os sinais são claros,
o caminho que segues é um bom caminho.

Você terá sucesso na empreitada.
 Mas não se esqueça:
O Presente está no olhar.
sua máquina de apreensão e de foco na vida
O olhar abre a porta da percepção.
A percepção só existe com a consciência.

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