sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

ANOREXIA AFETIVA




Sonhei que minha irmã, cunhado e sobrinha estavam aqui em casa com mais uma turma de amigos. Eu permanecia esquiva na garagem quando minha mãe veio conversar comigo. Havia uma viagem programada para Caldas Novas, mas eu não queria ir, pois não achava que fosse um passeio agradável se ia ter que aguentar a “convivência familiar”. Nisso a turma de amigos já de saída para irem embora vieram se despedir de mim. Enquanto apertava na mão de algumas senhoras, uma delas perguntou algo que não lembro, e minha resposta um tanto objetiva demais foi: “porque assim tenho sossego”. Havia um homem já de meia idade que invocado queria dançar comigo, mas eu não estava interessada e me esquivava. Nisso uma jovem me abraçou para se despedir e percebendo que meu abraço era com descaso ela mandou-me abraçá-la forte. Embora também não estivesse interessada em tal abraço, o fiz pensando que assim ela me largaria logo. Entretanto ela não se desabraçava de mim e cheguei a comentar isso em voz alta quando simplesmente me desabracei dela, embora continuasse presa no abraço. Achei aquilo chato, mas ao mesmo tempo era curioso e tentava desvendar que motivo a fazia comportar-se daquele modo. Os demais não estranharam o fato e talvez ela realmente tivesse mania de “se grudar” aos outros. Mas o que a levava a isso? Estaria ela tentando conquistar minha consideração? Estaria ela achando que eu precisava de afeto? Estaria ela querendo ser caridosa? Estaria ela numa crise de carência da minha pessoa, mesmo tendo acabado de me conhecer? Como eu não estava por conta de ficar abraçada a ela, fiz mais força para desvencilhar-me e assim que consegui retirei-me para beber água. Minha sobrinha foi atrás de mim e suspirando fundo, como que para espantar a irritação de não conseguir ficar sozinha, esquivei-me outra vez e não lhe dei atenção.

O vocábulo esquivo nos dá a dimensão do comportamento e da emoção que mapeia o sentimento do sonhador. Esquivo- adj (germ *skiuh) 1 Que se esquiva. 2 Que rejeita afetos ou carinhos; arisco. 3 Reservado, retraído; insociável. 4 Irritável. 5 Rude. 6 Aborrecido. Var: esquivoso. (Michaellis - português)


Distanciamento crítico, afetivo, afetuoso, social.

O papel de quem chama a atenção para si, porque não consegue partilhar o convívio? Insociabilidade.

Deseja a convivência, mas dentro de seus limites, de acordo com a forma preestabelecida nas relações. Se relaciona com o outro com a negação

O sonho indica o apelo coletivo pela sua inclusão nas relações, sendo solicitada para interagir e você respondendo com a negação, a esquiva e a Rejeição. Lamenta a rejeição, mas atua rejeitando, se distanciando, se excluindo e excluindo, desprezando, criticando. Como já lhe disse anteriormente: Segregando e se segregando.

Deseja o convívio, mas se isola, como numa ilha, onde se basta. A convivência familiar se torna um martírio. As pessoas lhe tiram o “sossego” . Mas onde reside o desassossego?

Você reafirma o pensamento existencialista Sartreano: “O inferno são os outros”

Mas... Não apenas os outros.
 O mercado está dentro de si mesma.
O inferno é criação pessoal.
O sujeito se inferniza e se atormenta.
Cria e projeta sua criação.
O mundo que escolhe viver.

A viagem é a indicação de mudança que você evita por capricho, desinteresse ou porque para realiza-la se faz necessário aceitar um pré requisito básico: a inclusão social, a participação no coletivo, o abandono dos ressentimentos e mágoas do passado, o abandono da “vendetta” afetiva, a rejeição.

A dança que é parece-me a maior expressão lúdica do seu afeto, pelo movimento e desafio e pelo seu lado exibido que anseia aceitação também é rechaçada. Ou seja, envolvida na ação de exclusão e de rejeição da irmã e da mãe, todo o coletivo é contaminado e você atinge a si mesmo se boicotando em possibilidades de laser e elação. Prevalece o foco na negação.

Voce abandona suas possibilidades de realização e mergulha na punição do outro e de si mesmo, no mundo do NÃO!

Um lado interessante do “não” é a ação contaminadora que aciona. O sujeito passa a retirar prazer do “não dito”, da punição que inflige ao outro. O não passa a ser uma forma de poder de frustrar o outro. O sujeito entra num estado compulsivo negativo em que se aprisiona num Looping enredando os fios de seu destino. Quanto mais diz não, mais nãos dirá.

Frustrando o outro ele obtém prazer NA NEGAÇÃO, mesmo que também se puna, se impedindo de outros prazeres. A ação se envereda na compulsão negativa, “o impedimento”, fazendo do sujeito um ANOREXICO AFETIVO. Ao invés de se alimentar do afeto e do prazer da comunhão ele se alimenta na negação do afeto.

O anorexico não deixa de se alimentar,
simbolicamente se alimenta do prazer em se punir
em nome da vaidade.

Costumo ressaltar os perigos e as armadilhas com as quais nos defrontamos em nosso dia a dia. Praticamente tudo tem armadilha quando a consciência se perde, quando o sujeito abandona o senso crítico e se torna resultado dos movimentos que não soube limitar.

Os limites são fundamentais na formação de uma pessoa, no estabelecimento de sua conduta, na disciplina de seus hábitos, mas se tornam uma armadilha quando passam a limitar a expansão da pessoa, impedindo-lhe de realizar aquilo que lhe é imprescindível realizar.

O seu destino lhe empurra para a vivência coletiva, que significa os rituais de crescimento, amadurecimento e transposição para a vida adulta. Quando se perde em velhos hábitos ou formas de responder aos reclames da vida, como por exemplo na negação, você se boicota e se impede de interagir de forma mais ampla com as pessoas do seu entorno. Se fecha numa ilha e se alimenta do isolamento que se impõe e do prazer de se negar ao outro.

Neste momento a resistência prevalece, seu mundo se contrai, você se paralisa encantada com o seu poder de frustrar, os sinais indicam perigo de retrocesso prevalência das velhas formas de se manifestar no mundo.

Você nega o afeto,
abandona a “Viagem” ,
se alimenta do não alimento.
Se perde no não.


Adendo - Criei a denominação e estou usando pela primeira vez,  o termo Anoréxico afetivo  para me referir à negação afetiva e à negativa de interação, como  forma do sujeito se esvaziar do sentimento e dos afetos que dentro dele deixam de se realizar e cumprir o seu destino de projeção no mundo. oportunamente descreverei mais este conceito que para mim bem caracteriza determinados Labirintos Afetivos nos quais mergulhamos.
Em caso de já ter sido utilizado por outra pessoa, perdoe-me a desinformação.

Ψ

2 comentários:

  1. Excelente texto! Parabéns!!! e obrigada...

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  2. Gente, meus parabénsssssssss texto perfeito.Eu pensava que era anorexa afetiva por não saber demonstrar meus sentimentos, não conseguir me expressar verbalmente, não com certeza esse perfil não é o meu, mas o reconheci em uma outra pessoa, espero que ela também se reconheça.

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