quinta-feira, 13 de maio de 2010

ABANDONO I


CH 65


Essa noite sonhei que minha mãe passava mal e minha irmã extremamente ágil pegou o carro para irmos fazer umas compras para ela. Mal tive tempo de apagar a luz e a televisão que ela deixara ligada. Mamãe ia ficar sozinha a vomitar no banheiro. Minha irmã pareceu tão apressada que eu nem tive tempo de raciocinar o que estava acontecendo. Alguém comentou que melancia era boa para aquele enjôo. Eu não entendia aquela pressa, pois mamãe vomitava, mas isso não significava que ela estivesse correndo risco de vida e nem entendia por que aquela urgência de comprar frutas exatamente naquele instante em que deveríamos ficar lá, ao lado dela. Fiquei receosa dela estar com alguma complicação séria.

Quando fui entrar no carro notei que havia uma conhecida de minha irmã no banco da frente e então tive que entrar atrás. As duas conversavam cochichando e eu só entendia o que falavam por fazer uma leitura labial de ambas através dos vidros do carro que estavam fechados e as refletiam. Entretanto não lembro da conversa e sim que minha irmã corria muito e receosa coloquei o cinto de segurança mesmo sabendo que já estávamos praticamente chegando ao supermercado. Entretanto minha irmã não foi a nenhum supermercado e sim a uma loja de artigos para bebês. Nesse momento desconfiei que minha mãe estava grávida (isso é incabível com a realidade). Fiquei muito chocada sentindo enorme melancolia e pensando que eu não seria mais a caçula e teria de dividir tudo o que era (ou seria) meu com essa outra criança. Seria apenas mais uma pessoa no mundo para me criticar e não gostar de mim. Eu não queria ter de sofrer tudo isso outra vez (confesso que senti esse medo de ser desprezada com relação a minha sobrinha adotiva, pensando comigo que ela seria apenas mais uma na família para me esnobar). Eu não estava irritava, apenas pesarosa e triste, mas fazendo força para pensar de maneira positiva. Eu sabia que tudo o que estava pensando e sentindo era um monte de bobeiras, mas ainda assim era real dentro de mim. Eu precisaria de um tempo para sentir o oposto e buscava me autoconceder essa precisão.

Quando fomos passar no caixa uma jovem negra (não sei se tem importância, mas era a atriz Aparecida Petrowky) comentou que fizera os exames de gravidez e descobrira que perdera o filho homem ficando apenas com a menina. Embora não houvesse dito, ficou claro que até então ela estava esperando filhos gêmeos. Ela falou com alívio, achando o fato bom. Estranhei aquela postura materna e pensei que talvez ela não tivesse condições financeiras favoráveis para dois filhos de uma vez. Na hora em que estávamos indo embora eu tive de retornar para pegar meus óculos que esquecera na loja. Minha irmã bastante apressada já estava chegando no carro e eu ia logo atrás, dando passos largos, acompanhando a outra mulher que fora conosco. Foi para ela que comuniquei a precisão de voltar à loja, pedindo a ela que pedisse para minha irmã me esperar. Com tamanha pressa eu tinha quase certeza de que não seria esperada e continuava a não entender aquela correria, bem como o que minha irmã tinha em mente. Ao chegar de volta na loja a mesma já havia fechado, mas daí um senhor que trabalhava nela e conversava com uns amigos na calçada comentou que podia ir lá dentro pegá-lo para mim. Fiquei na espera e depois eu já estava era nas ruas de São Paulo. Eu peguei um ônibus qualquer e queria ir para a casa da minha irmã, mas não conseguia lembrar nem mesmo do bairro que ela morava. Nisso me veio o nome Tabajaras na cabeça (minha irmã reside no Tatuapé) e perguntei a uma das senhoras que estava sentada se aquele ônibus ia para lá. Ela estranhou como se não existisse tal bairro e respondeu que não, perguntando para a cobradora depois. Como eu estava um pouco distante, resolvi passar na roleta e assim falaria melhor com a mesma. Questionei se o ônibus chegaria a um ponto final ou terminal, pois embora dispusesse de mais dinheiro, não estava disposta a pagar outra passagem de ônibus, ou seja, eu queria sair daquele ônibus e pegar o certo independente da baldeação, mas contando que o passeio não saísse caro. Eu não estava preocupada de me perder, pois além de estar encarando aquilo como um passeio, tinha dinheiro suficiente para dormir em um hotel e, ademais, se eu conseguisse chegar nas proximidades do bairro da minha irmã, poderia ligar para ela me buscar de carro. Nisso a cobradora não quis me devolver o troco todo, dizendo que ia ficar com uma moeda para ela em troca do serviço prestado de informação. Embora parecesse justo, não gostei da ousadia dela. Pouco depois o ônibus chegou ao seu ponto final e fiquei dentro do veículo a esperar que ele fizesse o trajeto de volta para um suposto terminal. Eu nem sei como funciona os ônibus de São Paulo, mas aqui em Uberlândia é assim.

Nesse ínterim, a cobradora começou a se debater e logo incorporou vindo para o meu lado. Eu sabia que ‘aquilo’ seria comigo. Eu estava sentada e ao meu lado estava o motorista e uma fiscal. Nesse momento já não parecíamos estar dentro de um ônibus, mas de toda forma não dei atenção ao local em si. Ela aproximou-se e fiquei me indagando se ela estaria mesmo incorporada ou apenas fingindo aquilo tudo por algum motivo pessoal que não saberia deduzir. Perguntei quem era ele e de forma imprecisa a resposta foi: ‘Pode ser um caboclo’. Seus modos aparentemente discretos não se enquadravam no perfil de um caboclo e a resposta não me foi convincente. Ele perguntou se eu lembrava o que ele avisara da outra vez e a pergunta me soou com ar de cobrança, reprovação e advertência. Perguntei por parte de quem era o aviso, pois dentro do sonho eu vagamente poderia lembrar de muitos avisos, mas não sabia qual caboclo era ele e, logo, não tinha como saber de qual aviso ele se referia. O mais interessante é que eu não me senti intimidada e sabia que nem teria motivo para tal, mesmo que eu estivesse ali na condição de devedora ou de alguém desobediente que não cumprira algo. Senti que na verdade eu não tinha costume de dar importância suficiente àquelas comunicações. Tenho a sensação de que comentei sobre não gostar de gastar dinheiro com entidades. Infelizmente não lembro o resto. outra vez um sonho com caboclo...

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